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sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Anjos de Pelos e Patas

#EspecialmenteDiferente


Era 2003 e eu estava numa crise brava da minha cervical. Na época ainda não tinha sido fechado o diagnóstico de fibromialgia. Eu estava simplesmente travada de dor e sem movimentar o braço esquerdo direito. Em fins de 1999 já havia feito um tratamento de dor crônica com a aplicação de inibidores direto nos nervos da cervical, o que na época chamavam de bloqueio, porque diminuíam, por meio de um tipo de anestesia, o fluxo de informações que passavam pelos nervos. Segundo o médico eu deveria ficar sem dor uns dez anos, não durou nem três e quando voltou foi terrível. Foi ainda a época em que eu estava iniciando a vida aqui em Indaiatuba (mudei para cá em março de 2002) vocês podem bem imaginar todas as mudanças pelas quais passei neste período.

Foi neste quadro de crise de dores, afastamentos médicos e sem muitos conhecidos na cidade que acabei indo para a internet. Tinha descoberto a maravilha da máquina fotográfica digital e estava como uma nova de impressionantes 3 megapixels. Lógico que acabei no FOTOLOG e criando uma rede de amigos virtuais enorme. Foi lá que vi a Campanha que se fazia para a adoção de um Gatinho com necessidades especiais no Rio de Janeiro. A campanha estava sendo conduzida pela Cláudia Porto, a Glória e outras Protetoras que trabalhavam com os Gatinhos da Prefeitura. Ele tinha até um Site, o Adote o Ricardinho (ou algo parecido).



O Ricardinho parece ter nascido na própria Prefeitura ou ter sido abandonado lá ainda bem filhote. Ainda filhote ele levou uma pazada na cabeça e quase faleceu; foi socorrido por uma servente da Prefeitura que o levou para casa para ele poder morrer quentinho. Enrolou em panos e o colocou sob uma luz. Ele não morreu e ela não podia ficar com ele. Ricardinho então voltou para os Jardins da Prefeitura, só que com o agravante de uma lesão neurológica em consequência da pazada. Ele não andava direito, cambaleava ao andar, não conseguia pular. Imagina a vida de um filhote nestas condições. A Glória já o conheceu quase adulto, com uma bela rinotraqueite. Levou ao VET para tratamento e exames, e aí veio mais uma má noticias, o Ricardinho também tinha FeLV ou Leucemia Felina, causada por um vírus, é extremamente infecciosa, e como afeta o sistema imunológico, gatinhos com FeLV precisam de maiores cuidados e de se evitar situações de estresses. O tempo corria e o Ricardinho não podia mais ficar hospedado na Clínica; voltar para a Prefeitura era o mesmo que a morte. Eu tinha, na época duas Gatas, a Zayra e a Maehda; trazer um gato com FeLV estava fora de condições, porque seria colocar as duas em risco. A minha sogra, que morava em frente de casa e que tinha um cachorrinho, deixou que eu trouxesse o Ricardinho do Rio de Janeiro. Ele ficaria na casa dela, num espaço seguro da edícula nos fundos. Foi assim que ele veio de avião do Rio de Janeiro para Indaiatuba numa quinta-feira Santa. O nome Freddy Ricardo foi colocado pela minha sogra.

(recuperei este trecho em uma foto do Fotolog:

“Existem no Rio de Janeiro umas moças muito especiais, a Mamy diz que são Anjos que ajudam os gatinhos necessitados, ela as chama de Gateiras de Plantão também. No ano passado procuravam arrumar um Lar para um gatinho especial: Ricardinho. Ele estava na prefeitura do RJ... Com sequelas neurológicas de uma pancada na cabeça; Portador de Felv; Necessitando de quem olhasse por ele. Foi montada uma página na NET pela Tia Cláudia Porto; A Tia Glória enviava várias de mensagens pedindo que se fizesse o possível para encontrar um Lar para este gatinho especial. Aí vieram as chuvas em abril... e o Ricardinho adoeceu porque ele não conseguia se esconder (lá não tem um abrigo... a apenas uma área externa que fica cheia de gatinhos que lá são abandonados). A Tia Glória conseguiu colocá-lo em uma clínica, só que o tempo estava passando e ele não podia continuar internado. A Mamy ligou para a Tia Glória e pediu que se arrumasse uma maneira de mandar o Ricardinho para cá. E ele veio de avião numa quinta-feira santa. Ricardinho foi rebatizado...Hoje é o Freddy Ricardo, dono da porta da geladeira... e do coração de todos desta Turminha.” )


Pouco tempo depois da vinda do Freddy a minha sogra faleceu por problemas cardíacos. Tomei a decisão de imunizar as duas gatas com a quíntupla e trouxe o Freddy Ricardo para a minha casa (grande mudança, apenas atravessar a rua). Eu de licença médica quase todo o tempo, uma bela depressão, entupida de remédios e cheia de dores, ficava acompanhando a adaptação daquele Gatinho mais que especial a rotina da casa. Eu havia arrumado um espaço reservado para ele, mas esqueci de contar que ele não poderia passar para o outro lado, e com esforço ele superou as  barreiras; usava as caixas de areia sem nenhum problema, tinha a caminha dele no chão, bem quentinha. Impôs sua presença a Zayra e Maehda, era ainda por cima um gato Alfa. Aí veio mais duas gatinhas, a Morgannah que veio filhotinha da Santa Casa em São Paulo e a Corina, já adulta cuja Tutora havia falecido. E o Freddy protegia a filhotinha e a Corina dos ataques da Zayra. Impressionava vê-lo correndo pelo corredor para se colocar entre a Tigrada imensa e as duas novatas. Ou então quando eu estava enrodilhada no sofá e ele deitava no tapete e ficava olhando para cima, medindo as distâncias. Um dia ele simplesmente pulou para cima da Chaise-longue. Imagina a minha alegria, meu susto, meu tudo.



Leia este trecho que postei numa foto no Fotolog:

Temos muito o que aprender com os animais. O Freddy Ricardo é um exemplo, apesar do problema neurológico e a consequente diminuição de suas capacidades com o comprometimento dos reflexos e movimentos da parte traseira, ele faz de tudo. E não se incomoda se o seu andar não é tão macio e elegante quanto os dos outros felinos. Encara os desafios (como subir nos sofás)... e os supera. É dono do seu espaço e o defende... é o Guardião-Mor da porta da geladeira. Ele é o exemplo em que busco forças todos os dias para superar as limitações que o problema na coluna cervical vem impondo ao meu ritmo no dia-a-dia.
E não é apenas o Freddy Ricardo... muitas amigas e amigos que possuem algum animal com qualquer tipo de deficiência irão relatar várias situações onde estes seres especiais superam os seus limites e têm uma vida feliz.”


No curto tempo que esteve conosco ele teve vários problemas, consequência da própria FeLV que vai minando o sistema imunológico. Esteve internado, recuperava e voltava para casa. Até que não mais conseguiu e partiu para brincar nos campos depois da Ponte do Arco-Iris. Não sem antes ter ensinado muito para tantas pessoas. Até hoje o Cássio quando fala de superar as dificuldades lembra do Freddy Ricardo.  Foi com ele que eu aprendi que posso fazer, posso superar as dificuldades, posso levar uma vida normal, superando cada obstáculo a seu tempo, aprendendo a contornar os que são muito grandes e, o principal, sendo eu mesma apesar de todas as minhas limitações e que estas não me impedem de ser feliz.

O texto abaixo recuperei também no Fotolog, é de quando ele atravessou a Ponte do Arco–íris:

Existiu um dia um Gatinho muito especial.
Por causa dele muitas pessoas se uniram.
Mami Glória tratou dele na Prefeitura do Ria de Janeiro,
Mami Cláudia, também dele olhava,
E a Dinda Cláudia Porto fez até uma página na internet...
para que ele tivesse a oportunidade de ter uma família.
Depois veio a Dinda Jucélia... que muitas sessões de Rei Ki aplicou.
Tem ainda a Tia Magali "Magatos" e o Tio César que uma vez pensaram em adotá-lo... só que Mamy Clê chegou na frente.
Tia Onéia... que acompanhou todas as quedas e recuperações... e que aprendeu a amar este Gatinho tão especial.
E foi assim que conheci pessoas incríveis.
Foi assim que tive a oportunidade de ter um dos maiores amores peludos.
Ele chegou Ricardinho... e por obra e graça da minha sogra foi Freddy Ricardo.
E assim chegou este petibanco tão especial...
que tanto ensinou...

Ensinou a ser perseverante e a fazer frente às limitações.
Ensinou a ter reconhecimento pelos que nos querem bem.
Ensinou o valor de um olhar amoroso.

Nunca mais terei o meu Guardião da Geladeira...
O meu companheiro que me seguia por todos os lados.
Aquele gatão Petibanco, desengonçado e amoroso.

Hoje ele se foi... descansar desta vida que lhe trouxe muito sofrimento.
Descansar de tantas maldades que sofreu por estas ruas...

Mas ele também conheceu muitas formas de amor...
AMOR incondicional... amor regado a admiração...
Carinho por ser ele quem ele era.

FREDDY "RICARDINHO"...
Para sempre em nossos corações


E ainda estes aqui:

“ Se o tempo dele conosco foi tão curto (pouco mais de um ano) ele foi intenso... intenso em carinho, em amor e em vitórias. Vitória contra uma infecção nos olhos que prejudicavam a visão do Gatão; vitória dele contra as suas limitações... como no dia que ele, num salto, conseguiu subir na chaise-longue; vitória contra a infecção intestinal em dezembro. E estas são só algumas... pois todos os dias eram de vitórias. O Freddy Ricardo se foi...mas o exemplo dele fica para nós. “

Há seres especiais...
São Anjos disfarçados...
Veem nos ensinar sobre coisas que são realmente importantes.
Sempre que tenho uma crise de dor ao tentar fazer algo...
ou mesmo quando bate aquela vontade de sentar a beira do caminho
e simplesmente desistir da caminhada...
Lembro-me de um Pequeno Guerreiro,
Meu Gatão Especial,
Meu PetiBanco que não desistia de superar as suas limitações.
São trinta dias de ausência... são trinta dias marcados por uma saudade imensa.
Freddy Ricardo... Saudades da Turminha... Saudades da Mamy...


Esta foi a História do Freddy Ricardo.



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Foi na época do Freddy Ricardo que o médico fechou o diagnóstico de fibromialgia. Meu braço esquerdo estava quase sem movimentos, eu sentia muitas dores e estava numa depressão homérica. A fibromialgia é um conjunto de sintomas, alguns de caráter infeccioso, afetando nervos, musculatura e muito do emocional. Mas, não é algo que seja detectável por um exame de diagnóstico, aparentemente não há uma causa física para todas os seus sintomas.

Pois lá estava eu, com dores, quase sem movimentos no braço esquerdo e por vezes sem vontade de sair da cama. No trabalho esteva quase a um passo de uma aposentadoria por invalidez. Mas, vendo todas as superações do Freddy Ricardo, da vontade dele, do nunca se entregar frente as dificuldades, vi que também poderia sair daquela situação. 

Mudei o tratamento, briguei no Ministério por condições de trabalho que fossem adequadas as minhas condições de saúde e limitações; voltei a trabalhar em condições especiais. Sai daquela depressão entorpecedora e encarei o mundo. Não dava para fazer 6 reuniões por dia, mas dava para fazer 2... vamos fazer diferença nestas duas. Não dá para ficar escrevendo no computador muito tempo, vamos usar um software de fala (usei algumas vezes para ditar textos, depois acabei não precisando mais). Se fazer uma atividade me cansa, estipulo um descanso, mas não deixo de fazer. Aquele Gatinho Petibanco me tirou de uma depressão profunda, me fez encarar as limitações da fibromialgia e seguir em frente. 

Quando muitos anos depois lesionei o quadril (ligamentos dianteiros e musculatura traseira do lado direito) e fiquei de cama mais de 40 dias, e sem saber se ia voltar a andar direito, foi no Freddy Ricardo que eu me apegava. Se ele corria e pulava com o problema neurológico, eu só precisaria de tempo para ver o grau da lesão e aprender a viver e superar. Voltar a andar ainda que com dores, muitas dores, foi excelente. Se precisava de mais exemplo de superação, ela veio na minha fase de adaptação desta lesão no quadril.

Eu já estava andando com a bengala, sentia dores e, é lógico sou humana, batia aquela revolta por estar mais uma vez com algo que me limitava. Foi a época que o Lippi, o cachorrinho do Cássio ficou muito doente, por causa de velhice mesmo, e adotamos uma gatinha (a Laddy) que veio com fungos. Passamos por quase todos os veterinários de Indaiatuba e acabei encontrando a Dra. Elaine. Na Clínica dela tinha um Poodle de três patas, era branco e super alegre. Ele adorava ser alojado nas jaulas próximas das minhas gatas (a Laddy e a Corina acabaram com rino por conta dos banhos frequentes). Era um barato ver a alegria do Branquinho em poder ficar perto das Gatas. Ele realmente adorava gatos. Quando eu chegava na Clínica ele vinha correndo para fazer festas. E eu ainda estava bem revoltada com o uso da bengala, cheguei a cair na rua por ter me recusado a sair com a bengala. Bem, o Lippi acabou falecendo, o coraçãozinho dele cansou e ele foi brincar nos jardins depois da Ponte do Arco-Íris. Estávamos procurando uma nova casa, com mais quintal e espaço para todos, quando estava quase fechando o negócio da minha atual casa falei para a Dra Elaine que se ela concordasse, eu adoraria adotar o Branquinho, ia precisar de um tempo para reformar a casa, adaptar o Branquinho com o Pablito e estas coisas. Ela concordou, por seis meses eu ia duas a três vezes na clínica para visitar o Branco, aos sábados ou domingos a gente o pegava para passear junto com o Pablito. No dia em que me mudei (16 de dezembro de 2008) bati na clínica as 22 horas para pegar o Branquinho e a Linna (que era uma filhotinha linda - a minha Corina faleceu, também de velhice, no mesmo dia que a Linna foi resgatada num bueiro se escondendo da chuva. Lógico que era um sinal dos Deuses, e a Linna veio para a minha Turma também). 



Eu o chamava de meu Tripé, era pura alegria. corria, andava e brincava muito. A ausência de uma das patas traseiras nunca foi empecilho para ele fazer o que desejava. Bem, se aquele cachorrinho podia viver bem e feliz com as suas limitações, se acontecia de cair era só levantar e tentar de novo. Porque eu, ser inteligente, dotado de razão iria me entregar  a uma limitação, e nem tão séria assim. Caso as dores sejam muitas, sempre há a possibilidade de algumas sessões de fisioterapia, alguns alongamentos e, como digo sempre no twitter, algumas drogas para analgesia. Mas, eu não deixo de fazer nada que tenho vontade. Não dá mais para dirigir carro mecânico, vamos para o automático (e eu acho muito mais emocionante o cambio mecânico), preciso da bengala para ter certeza que não vou levar um tombo, assumamos a bengala ( e ela traz atê um certo charme). 



Bem, o Freddy me ensinou a superar as limitações, a vencer cada dificuldade que a vida coloca a nossa frente. Agora o Branquinho me ensinou que além de superar, além de ir adiante, eu ainda posso ser feliz, muito feliz, mesmo com todas as limitações, mesmo com todas as dificuldades, mesmo sendo a vida uma batalha constante. A felicidade é o momento agora e eu sou FELIZ porque eu sou EU. 



São ou não são ANJOS peludos de quatro, três ou menos patas que passam por nossas vidas?